terça-feira, 20 de maio de 2008

Também quero partilhar

Às vezes tenho vontade de pegar um bloquinho de notas e andar com meu filho de 5 anos um dia inteiro, anotando quantas vezes ele diz aquele “ah!” engolindo o ar, típico de quem está profundamente surpreso. Pode ser um comercial de televisão, uma coisa que o caçula de 1 ano fez, um grafite que viu na rua, um bicho que viu em algum lugar, tudo parece ser razão para ele expressar sua surpresa com essa interjeição escandalosa. A minha predileta é quando ouço seu “ah!” assim que abro a porta de casa, no final do dia.


Embora o fato me chamasse muito a atenção e me divertisse muito também, eu ainda não o havia enxergado como uma virtude invejável do Dudu. Foi a leitura deste parágrafo de Brennan Manning que me fez notar: “tornar-se uma criancinha novamente (conforme Jesus ordenou que deveria acontecer) é recuperar um sentimento de surpresa, deslumbramento e vasto deleite com toda a realidade” (in Convite à loucura, p. 26).


Claro que Jesus apontou às crianças como modelos tendo mais do que esse fato específico em mente (inocência, credulidade, dependência, capacidade de perdoar, humildade e outras características também vêm no pacote), mas essa predisposição ao espanto era uma que me havia escapado. E é curioso que eu o haja percebido exatamente na semana em que atendi ao convite do Fred para visitar sua reunião do GEA na Usp.

Bem, a reunião foi ótima, ao menos para mim. Estávamos em 11 pessoas, sentadas no saguão do prédio da Faculdade de Educação. No começo, achei estranho se reunir assim, num lugar aberto e público, onde o movimento pode ocasionar alguma dispersão. Acabei gostando muito do modelo. O Fred disse que já houve ocasiões em que curiosos pararam e ouviram durante algum tempo. E não, não houve dispersão nenhuma. Me enxerguei no olhar daqueles caras, respirei um pouco daquele velho e bom ar, que me fez muito bem. E, contando pra eles minha experiência com o GEA, me dei conta de que ela aconteceu há já 15 anos.

Eu não saberia citar ipsis literis de cabeça o que Morris Venden disse, mas vou tentar: “Conquanto não possamos determinar o dia exato ou o momento em que isso aconteceu, todos podemos dizer se experimentamos a conversão ou não”. Bem, eu posso não saber o dia e a hora, mas sei que foi naquele ano de 1993. E o que acontece a alguém que se entrega sem reservas nas mãos de Cristo e experimenta essa metamorfose radical que se chama conversão, quinze anos depois?

Bem, a chama da fé continua bem acesa, mas é possível notar rugas e alguns efeitos colaterais indesejáveis, dentre os quais o triste espaçamento entre meus “ah!s” de deslumbramento. Se antes eles brotavam em qualquer sermão, em qualquer meio versículo da Bíblia, em qualquer céu azul lavado de chuva, agora eles são mais raros.

Mas Deus continua falando pelos sermões, pelos céus azuis e pela Sua palavra. E eu gostaria de recuperar a capacidade de dar um enorme e escandaloso "Ah!" mesmo ouvindo algo batido e clichê como "Jesus salva”.

Penso que igreja não é só aquele prédio lá, aonde vamos aos sábados, mas tudo o que orbita ao redor dela. O GEA, por exemplo. Que, associado a uma leitura meio sacolejante durante minhas viagens no trem metropolitano, me fez lembrar que eu continuo precisando me tornar como uma criança.

domingo, 18 de maio de 2008

Um pouco de partilha...

Estou lendo um livro o qual me foi recomendado por alguns amigos que aqui nos acompanham, cuja resenha na internet me motivou a comprar 3 exemplares: "Pagan Christianity?" de Frank Viola e George Barna, caso mais alguém por aqui se interesse (o Fred foi um deles).
Até onde tenho lido (basicamente a primeira parte dele), o mesmo tem apresentado uma visão histórica interessante da origem de algumas práticas que temos nas igrejas cristãs em geral, seja no formato dos programas, na estrutura organizacional, nos costumes, ou mesmo na arquitetura de seus edifícios. Nesta parte do livro há um especial destaque à influência de Constantino, imperador romano no início do século IV, e à cultura Greco-romana da época.
Comentando sobre este livro com alguns mais chegados, recebi um questionamento que me fez pensar:
"O que você está buscando ao ler este tipo de livro? Não estará trazendo mais sarna pra se coçar?"
 ... a pertinência desta pergunta me fez refletir sobre a minha motivação ao buscar este tipo de informação, e questionar alguns paradigmas que naturalmente vim assimilando durante a minha vida religiosa.
Recentemente tenho observado (e até sido parte de) alguns problemas de relacionamento pessoal dentro da comunidade que freqüento. Incrível, mas sabidamente isto é coisa comum dentro de comunidades, e acredito que - sem razões muito claras - ainda mais na denominação a que pertenço. Fiquei me perguntando o porquê desta triste realidade... eu poderia até elencar algumas razões para isto, sem acreditar que todas estejam certas... mas acho que não vale a pena entrarmos nesta seara... mas ainda assim: o que poderíamos fazer em nossas comunidades para mudarmos esta realidade? O que deixamos de aprender ou a que nunca demos a devida atenção e conseqüentemente tem nos feito cair em situações tão reprováveis? Alguns poderiam dizer:
"Isto é a nossa preparação para o céu! Suportai-vos uns aos outros!"
Confesso que tenho dificuldade de acreditar nisso, pois esta afirmação parece implicar em que nada podemos fazer a respeito destas questões relacionais, e que somos obrigados a conviver passivamente com elas, como se elas "viessem no pacote".

Fiquei me perguntando quando em minha vida tive uma experiência que nos permitiu trabalhar para Deus, e conseguimos conviver minimamente com este tipo de situação... uma das poucas para mim, e talvez a única consistente, tenha sido a que vários de vocês também compartilharam conosco nos dias de universidade... mas então, qual é a diferença ou as diferenças em relação às comunidades que freqüentamos hoje? Nossa vida menos responsável da época? Nossa imaturidade coletiva no desenvolvimento do trabalho para Deus? Uma expectativa descompromissada?
Relembrando estes tempos, acredito que perdemos uma grande oportunidade em não termos criado nossa própria comunidade durante aqueles anos... claro que a nossa então imaturidade não nos permitiu desenvolvermos mais essa idéia, que já vinha sendo acalentada por alguns de uma geração anterior. Mas quais teriam sido os resultados? Será que fatalmente cairíamos nos mesmos erros e teríamos os mesmos problemas relacionais com os quais atualmente convivemos tão naturalmente em nossas comunidades? Talvez outras experiências semelhantes a esta imaginada poderiam nos mostrar que existe a possibilidade de uma realidade diferente para nossa experiência religiosa (Klebert e Lilian, vocês não gostariam de compartilhar um pouco disto conosco?).

Voltando ao nosso ponto inicial, qual é a motivação para olharmos na história e entendermos o que aconteceu conosco cristãos? Talvez seja a esperança de encontrarmos alguns fatores que nos permitam modificar nossa atual realidade e transformar nossa experiência religiosa coletiva em algo mais próximo do que Deus espera de seus discípulos (Jo 13:35). É incrível como negligenciamos o Grande Mandamento (Mar 12:30-31; e não me refiro à parte a qual Deus está envolvido diretamente) em prol da segurança de nossos sentimentos, de evitarmos enfrentar nossos medos e de até protegermos nossos interesses pessoais. Isto me lembra uma citação de C. S. Lewis (sim, o mesmo autor de "Mere Christianity" e "Contos de Nárnia"):
“To love at all is to be vulnerable. Love anything, and your heart will certainly be wrung and possibly be broken. If you want to make sure of keeping it intact, you must give your heart to no one, not even to an animal. Wrap it carefully round with hobbies and little luxuries; avoid all entanglements; lock it up safe in the casket of coffin of your selfishness. But in that casket – safe, dark, motionless, airless – it will change. It will not be broken; it will become unbreakable, impenetrable, irredeemable… The only place outside Heaven where you can be perfectly safe from all the dangers… of love is Hell.”
Por isso, eu penso que se tivéssemos a chance de fazermos diferente as coisas em nossa experiência religiosa (e isto requer o Grande Mandamento como um todo!!), não seria mais fácil a Deus "ir acrescentando, dia a dia, os que iam sendo salvos"(At. 2:47)?
Sou capaz de dizer que eu estaria disposto a me arriscar e tentar tudo novamente, e sem alardes, tentar fazer diferente: algo menor, menos pretensioso, mais discreto... e buscar criar condições onde um ambiente mais orgânico (veja autores como Joseph Myers, Frank Viola e Brian McLaren para definições mais abrangentes) possa se desenvolver e pessoas (e eu me inclúo) possam conviver, compartilhar, trabalhar e crescer espiritualmente, muito além do que temos conseguido alcançar até hoje.

Será que estou sonhando demais? Por favor, me digam com toda a franqueza!
Bem, mas se existirem mais sonhadores por aí... que Deus nos abençoe a todos...

terça-feira, 13 de maio de 2008

Partilhando a vida

Estava lendo ainda a pouco a primeira carta que Paulo escreveu aos crentes de Tessalônica, e pude ter um pequeno vislumbre do que ocupava a mente dele ao viajar ensinando as pessoas a viverem uma vida diferente daquela que elas estavam acostumadas a viver. O aspecto fundamental da carta de Paulo é certamente a expressão do profundo carinho de Paulo, Silas e Timóteo pelos novos amigos que eles fizeram em Tessalônica, a quem ensinaram a viver uma vida quieta e serena cheia de alegria, amor fraternal e paz, ganhando o respeito e a confiança de todos ao viverem imitando a Jesus em seu novo estilo de vida. A saudade de Paulo, Silas e Timóteo revela-se tão intensa que Timóteo foi enviado para visitá-los e trazer notícias de como estavam os crentes (Paulo teria gostado de nossa comunicação global instantãnea via internete, não acham?). Ao saber que estava tudo bem com os Tessalonicenses a despeito da oposição que estavam sofrendo, Paulo escreve transbordando de alegria: "como podemos agradeçer a Deus o suficiente por tanta alegria que vocês nos proporcionam?"*

É evidente que Paulo tem uma relação muitíssimo mais estreita com os seus irmãos em Cristo do que nós temos com a maioria dos nossos irmãos em Cristo. Vejam só o que ele diz na carta: "Nós os amamos tanto que foi uma delícia partilhar com vocês não só as boas novas, mas também nossa própria vida, uma vez que vocês se tornaram tão queridos para nós!" Ah, quantas vezes somos encorajados a partilhar somente o evangelho e desencorajados de partilhar a vida?! Lamentavelmente isto acontece mais frequentemente do que deveria acontecer...

Será que não é para isso que serve igreja? Partilhar não somente as boas novas, mas também e principalmente a nossa própria vida? Este é também um dos objetivos deste blog. Portanto amiguinhos, não se acanhem. Partilhem conosco suas vidas :-)


* Tomei a liberdade de parafrasear o texto biblico para lhe dar uma roupagem menos formal e propositadamente omiti a referência exata para encorajar a leitura completa do texto. A carta não é longa e vale a pena ser lida.