sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Minha pesquisa de mercado

Minha pesquisa de mercado sobre o que as pessoas pensam de minha igreja não teve método científico nem uma mostra estatisticamente relevante. Mesmo assim, eu a tenho em alta conta. 

Começou quando eu era ainda adolescente, no clube que frequentava com minha família (no tempo em que as pessoas frequentavam clubes). Uma amiga de minha mãe vira pra ela e pergunta: "Glícia? Você é adventista? Mas como?! Você é legal!" Depois dessa introdução bombástica, ela explicou que morava numa região com alta concentração de adventistas. Resumindo sua visão deles, afirmou que eram pessoas que não se misturavam, prepotentes e cuja grande preocupação na vida parecia ser comprar roupas maravilhosas para usar aos sábados.

Anos mais tarde assisti a uma entrevista de Mano Brown, líder dos Racionais MCs, que estudou em uma de nossas escolas um breve período de tempo. Em rede nacional ele descreveu sua impressão dos adventistas. Embora tenha usado outras palavras, ela incluía prepotência e roupas lindas.

Passam-se alguns anos mais e leio uma coluna do escritor Ferrez na revista Caros Amigos em que ele, como morador do Capão Redondo, dá sua visão dos adventistas e adivinhe?

João 13:35 afirma que o mundo conheceria os discípulos pelo amor que tivessem uns pelos outros. Roupas lindas decerto não era um elemento distintivo. No entanto, aquela amiga de minha mãe relatou uma diferença de comportamento curiosa entre adventistas e não adventistas: em frente à casa dela aconteciam muitos acidentes, ocasião em que todos saíam para ajudar, menos você sabe quem. Estes se limitavam a afastar a cortina para dar uma olhadinha.



Narrei essa "pesquisa de mercado" em uma classe de escola sabatina certa vez e fui praticamente crucificado. As roupas lindas foram defendidas com unhas e dentes. Uma das coisas que ouvi foi: "quem é Mano Brown para dizer como devemos viver?" Bem, posso responder a essa pergunta hoje: Mano Brown é parte do oceano de pessoas que temos a missão solene de alcançar. É uma parte singular desse oceano porque o tivemos nas mãos e perdemos. Você só despreza a visão dos outros sobre si próprio quando não tem como missão de vida amar essa pessoa. E este não deveria ser o nosso caso. Não se trata de conhecer a visão deles para nos tornarmos aquilo que eles querem que nós sejamos, mas para ser aquilo que nosso Mestre nos comissionou a ser. Pessoas que se importam. Pessoas que vão atrás. Pessoas que amam. Amam algo mais que suas roupas lindas.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Quem ama a sua vida... - Parte I

Nesta semana, com a família saímos de carro a uma viagem do tipo bate-e-volta no mesmo dia, 400km o trecho. Claro que, para minimizar o tédio das crianças durante a viagem, saímos bem de madrugada e com os dois pequenos (já não tão pequenos) dormindo com um Dramin cada um no banco de trás. E foi assim que, durante as quase 5 horas de viagem enquanto eu dirigia, pude meditar sobre um verso que há muito me faz pensar nas possibilidades de sentidos que Jesus quis comunicar.

Quem ama a sua vida, perdê-la-á; mas quem aborrece a sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna. João 12:25
Quem ama "a sua vida"... seja "esta vida" a terrena ou a futura, amá-la significa inexoravelmente perdê-la.
Eu tenho me perguntado por quê tem sido mais importante pra nós o que fazemos no templo (construção onde se reúnem os membros da igreja, palavra comumente confundida com este edifício) do que fazemos fora dele. Explico-me, por que nos preocupamos tanto com as liturgias, as formas, a frequência de presença aos cultos, com a qualidade dos programas ali desenvolvidos, ou mais ironicamente com a gravata dos que vão à frente do salão? O que realmente estamos buscando com estas práticas? O que queremos alcançar através destes mecanismos? Por mais que esta reflexão nos doa na alma, descobrir nossas motivações revelam-nos muito sobre nós mesmos.
Uma noite, durante uma reunião de amigos a quem amo muito, um destes me abordou com uma pergunta que parecia intrigá-lo há muito tempo: "Gabriel, por que você não vai aos cultos de domingo nem de quarta-feira?". Confesso que me assustei com as possibilidades de onde esta pergunta poderia nos conduzir na conversa, considerando a diversidade de pessoas ali presentes, ao ponto de perguntar-lhe de volta: "Você tem certeza de que quer entrar neste assunto?". Esta questão é tão delicada, pois pode nos expor ao ponto de sermos incapazes de reconhecer-nos ou de aceitar nossas motivações. Por isso eu estava assustado, preocupado com as consequências dessa conversa.
Por que temos que associar o nível de espiritualidade, ou proximidade de relacionamento com Deus, com a assiduidade aos programas promovidos institucionalmente no templo? Não quero de modo algum condenar os cultos nos templos, nada de errado com eles, pois acredito que não são eles o cerne do problema IMHO, mas sim nós mesmos.
A começar pelos pressupostos da pergunta: "Por que você não vai aos cultos"... Falamos dos cultos como se fossem eventos promocionais, ocasiões preparadas para o consumo em massa de entretenimento religioso. Música, luzes, eloquência, emoção, choro, alegria, reflexão. Intuitivamente esperamos que o que ocorra ali seja de algum modo uma experiência que nos impressione, que fique um bom tempo em nossa mente como um excelente filme de sábado à noite, emocionante, imprevisível e que nos faça sentir bem.
Por favor, não quero eu julgar você, mas se os seus argumentos à pergunta do meu amigo têm algo do tipo: "Eu vou porque lá eu me alimento espiritualmente, recarrego minhas baterias, recupero minhas forças para a semana...", o culto provavelmente não parece muito diferente de um bom programa de televisão. Você foi ao culto, como se este fosse um lugar, em busca de algo para si, para receber em seu benefício, no exercício pleno do individualismo desta nossa geração.
Porém, não seria o culto algo que se presta, algo que se oferece, que se rende a Alguém? Não deveríamos ir ao templo (e não ao culto) com a expectativa mais de doarmos do que de recebermos? De nos entregarmos mais que de saciar-nos? Não estaríamos invertendo completamente o sentido das palavras para atender às nossas motivações inconscientes?
Ainda que tudo isto tenha uma nobre razão: nossa vida eterna. Não seria esta forma de pensar um reflexo do amor que temos pela nossa própria vida, ainda que seja a eterna?
Quem ama a sua vida, perdê-la-á...
O que é que não estamos enxergando? O que deixamos de ver ou perceber na nossa relação com Deus, a qual nos parece muitas vezes tão insuficiente e inconstante?
E se mudássemos intencionalmente nossas palavras? Será que este seria o início de uma mudança em nossas motivações? Esta mudança nos aproximaria mais de Deus?

Ainda tenho mais perguntas que respostas...

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Um método para mudar o mundo

Are they indeed?
Você pode dar de ombros dizendo que o mundo é assim mesmo ou pode fazer parte da igreja. A igreja é uma demonstração clara de que Deus não está conformado com o jeito como as coisas são. A igreja é um agente de mudanças. Pode até ser um mau agente de mudanças, pode ser até um agente ineficaz de mudanças muitas vezes, mas, desde seu princípio, é para isso que ela existe. As perguntas que nos ocorrem na sequência são: 1) quê mudanças a igreja deve promover no mundo? e 2) como ela consegue essas mudanças?

Bem, quanto à primeira pergunta, é bom considerar que a igreja age de forma bem diferente da política e da economia. Essas ciências buscam impor a mudança de forma coletiva, massificada, ao passo que a igreja foca no indivíduo. Os sacramentos da igreja são algumas vezes tomados coletivamente, mas sempre em porções individuais e o mais importante deles, o batismo, é individual, como individual é a salvação. Bem, e qual é a mudança que a igreja faz no indivíduo? Segundo o livro “Believing, behaving, belonging”, de Richard Rice, essa mudança passa por esses três elementos: a) começar a acreditar e confiar em Deus, b) se comportar de um jeito diferente e c) pertencer a uma comunidade de crentes.

Quanto à segunda pergunta, é importante notar como Cristo fazia e como nós fazemos, porque infelizmente são duas coisas diferentes. Para fazer discípulos, Aquele a Quem chamamos de Mestre chamava as pessoas para passar tempo com Ele. “venha e veja”, o convite de Filipe a Natanael (João 1:46), é a expressão exata do método de Jesus. O embrião do que mais tarde se tornou o corpo de apóstolos, o time que chacoalhou o mundo helênico e mudou a História, foi aquele grupo de homens seguindo Jesus por onde Ele ia, comendo com Ele, vendo como Ele reagia quando uma criança aparecia, observando como Ele se comportava com os líderes religiosos de então, ouvindo a base teórica de Seus atos nos Seus sermões e nas Suas conversas casuais.

O que estou tentando dizer é que Jesus começava o processo de mudança do mundo recebendo as pessoas em uma comunidade de amor e companheirismo. Era isso o que levava a pessoa a uma relação pessoal substanciosa com Deus e só então é que vinha a mudança dos hábitos e comportamentos exteriores.

Se a igreja hoje falha em mudar o mundo é porque ela inverte completamente essa dinâmica exigindo que a pessoa de alguma forma, por milagre ou por “combustão espontânea”, passe a acreditar em Deus, então mude de comportamento para só aí ser recebida na comunidade de “santos”.

Se a igreja hoje falha em mudar o mundo é por não estar de braços abertos para quem (ainda) é diferente. Ela tem perdido um tempo precioso se esforçando para parecer diferente (nós usamos uma roupa diferente em um dia diferente, ouvimos música diferente e morremos de medo de ser contaminados pelo “mundo”). Mas não faremos discípulos se não tivermos sido discípulos antes e as pessoas serão atraídas não pela roupa que usamos, mas por reconhecer que temos nos relacionado com Alguém diferente.

Que a enorme massa de almas feridas que vaga errante por esta cidade seja abrigada em uma comunidade menos propensa a julgar e mais propensa a amar incondicionalmente, para que o restante do processo tome seu curso natural.