sexta-feira, 26 de julho de 2013

Quem ama a sua vida... - Parte I

Nesta semana, com a família saímos de carro a uma viagem do tipo bate-e-volta no mesmo dia, 400km o trecho. Claro que, para minimizar o tédio das crianças durante a viagem, saímos bem de madrugada e com os dois pequenos (já não tão pequenos) dormindo com um Dramin cada um no banco de trás. E foi assim que, durante as quase 5 horas de viagem enquanto eu dirigia, pude meditar sobre um verso que há muito me faz pensar nas possibilidades de sentidos que Jesus quis comunicar.

Quem ama a sua vida, perdê-la-á; mas quem aborrece a sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna. João 12:25
Quem ama "a sua vida"... seja "esta vida" a terrena ou a futura, amá-la significa inexoravelmente perdê-la.
Eu tenho me perguntado por quê tem sido mais importante pra nós o que fazemos no templo (construção onde se reúnem os membros da igreja, palavra comumente confundida com este edifício) do que fazemos fora dele. Explico-me, por que nos preocupamos tanto com as liturgias, as formas, a frequência de presença aos cultos, com a qualidade dos programas ali desenvolvidos, ou mais ironicamente com a gravata dos que vão à frente do salão? O que realmente estamos buscando com estas práticas? O que queremos alcançar através destes mecanismos? Por mais que esta reflexão nos doa na alma, descobrir nossas motivações revelam-nos muito sobre nós mesmos.
Uma noite, durante uma reunião de amigos a quem amo muito, um destes me abordou com uma pergunta que parecia intrigá-lo há muito tempo: "Gabriel, por que você não vai aos cultos de domingo nem de quarta-feira?". Confesso que me assustei com as possibilidades de onde esta pergunta poderia nos conduzir na conversa, considerando a diversidade de pessoas ali presentes, ao ponto de perguntar-lhe de volta: "Você tem certeza de que quer entrar neste assunto?". Esta questão é tão delicada, pois pode nos expor ao ponto de sermos incapazes de reconhecer-nos ou de aceitar nossas motivações. Por isso eu estava assustado, preocupado com as consequências dessa conversa.
Por que temos que associar o nível de espiritualidade, ou proximidade de relacionamento com Deus, com a assiduidade aos programas promovidos institucionalmente no templo? Não quero de modo algum condenar os cultos nos templos, nada de errado com eles, pois acredito que não são eles o cerne do problema IMHO, mas sim nós mesmos.
A começar pelos pressupostos da pergunta: "Por que você não vai aos cultos"... Falamos dos cultos como se fossem eventos promocionais, ocasiões preparadas para o consumo em massa de entretenimento religioso. Música, luzes, eloquência, emoção, choro, alegria, reflexão. Intuitivamente esperamos que o que ocorra ali seja de algum modo uma experiência que nos impressione, que fique um bom tempo em nossa mente como um excelente filme de sábado à noite, emocionante, imprevisível e que nos faça sentir bem.
Por favor, não quero eu julgar você, mas se os seus argumentos à pergunta do meu amigo têm algo do tipo: "Eu vou porque lá eu me alimento espiritualmente, recarrego minhas baterias, recupero minhas forças para a semana...", o culto provavelmente não parece muito diferente de um bom programa de televisão. Você foi ao culto, como se este fosse um lugar, em busca de algo para si, para receber em seu benefício, no exercício pleno do individualismo desta nossa geração.
Porém, não seria o culto algo que se presta, algo que se oferece, que se rende a Alguém? Não deveríamos ir ao templo (e não ao culto) com a expectativa mais de doarmos do que de recebermos? De nos entregarmos mais que de saciar-nos? Não estaríamos invertendo completamente o sentido das palavras para atender às nossas motivações inconscientes?
Ainda que tudo isto tenha uma nobre razão: nossa vida eterna. Não seria esta forma de pensar um reflexo do amor que temos pela nossa própria vida, ainda que seja a eterna?
Quem ama a sua vida, perdê-la-á...
O que é que não estamos enxergando? O que deixamos de ver ou perceber na nossa relação com Deus, a qual nos parece muitas vezes tão insuficiente e inconstante?
E se mudássemos intencionalmente nossas palavras? Será que este seria o início de uma mudança em nossas motivações? Esta mudança nos aproximaria mais de Deus?

Ainda tenho mais perguntas que respostas...