sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Lei e disciplina II

Na postagem anterior introduzi a questão das formas, ou seja, como discutir e aplicar a prática da vida cristã na vida de um cristão. No GEA evitávamos o assunto por princípio. Nos fóruns da igreja normalmente vemos o oposto. Qual seria o melhor caminho?

Em tempos recentes tenho estado cada vez mais convencido de que estamos parcialmente, se não completamente confusos quanto à teoria e a prática do processo de redenção. Em certo sentido a confusão está relacionada ao antigo dilema entre fé e obras, agora exacerbado pela tensão entre a mentalidade moderna e pós-moderna. O julgamento do viver correto é o ponto central da confusão, ou a distinção entre lei e disciplina, esta última pouco compreendida pelos cristãos em geral e menos ainda pelos adventistas. A estorinha a seguir oferece um ponto de partida.
Sábado à tarde, almoço encerrado, sobremesa servida na casa do ancião da igreja que você está visitando com outros amigos. Todos sentam-se na sala para um bate papo descontraído e a esposa do anfitrião então pergunta: "alguém aceita um cafezinho?"
Independente de onde você se encontra no espectro de tendências, é muito provável que ficará intrigado com a situação. Seria o ancião da igreja casado com uma senhora não adventista? Será que se trata de um irmão progressista? Será que o café é descafeinado? Ou será que o anfitrião nunca leu o Ciência do Bom Viver ou o Manual da Igreja?

Esta ilustração pode ser adaptada para muitos outros temas relacionados com o estilo de vida adventista, e tem a clássica formulação para gerar um infindável debate sobre se devemos ou não tomar café, ou em círculos mais dogmáticos, se é pecado ou não ingerir estimulantes. Como disse, no GEA não permitíamos as tais discussões das formas, portanto peço cautela aos leitores ao se pronunciarem nos comentários. Meu objetivo é analizar o caso de um ângulo diferente. Mas isso vai ficar para o próximo post.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

The Record Keeper - Série Estilo "Steampunk" sobre o Grande Conflito

Vocês já ouviram falar e/ou assistiram o Record Keeper? É uma série que foi inicialmente concebida e financiada pela Conferência Geral e no fim "abandonada" semanas antes do lançamento planejado porque os líderes teológicos e administrativos da igreja acharam que era muito problemático e muito "negativo" e "dark." Aqui está a notícia oficial em português no site da igreja.

Para aqueles que não conhecem a série, resolvi escrever um outro post no qual estou inserindo  o clipe do YouTube para o primeiros episódio (os outros podem ser facilmente encontrados) e também o link para o site que disponibilizou os episódios com legendas  em português (mais abaixo).

Nós já assistimos várias vezes e gostamos muito. A série foi concebida e filmada no estilo retro-futurista "Steampunk" (nossa, eu não tinha ideia que De volta pro futuro 3 é meio que considerado "steam" -- por causa do uso do trem, e quase decerto steampunk!). A narração concentra-se em dois anjos, um caído, outro que ficou ao lado de Deus e na "Guardadora dos Registros" que trabalha no céu registrando narrações objetivas de episódios chaves deste grande conflito. É fascinante!

O objetivo da conferência geral era utilizar cada episódio série como um dos elementos de uma série evangelística, acompanhados de um sermão, estudos bíblicos e coisa e tal. E inclusive algumas igrejas na região de Washington DC participaram de um plano piloto usando a série. Mas daí os líderes da igreja acharam que era polêmico demais e deixaram de lado como está explicado neste link (o lançamento estava previsto online para fevereiro do ano passado [2014]). A análise completa dos teólogos da igreja pode ser encontrada aqui (em inglês, em PDF).

No fim, a série acabou vazando e sendo partilhada no YouTube em julho do ano passado, o que foi "menos mal", pois pelo menos ela está disponível! O primeiro episódio, o piloto, foi postado pelo próprio diretor, mas os outros foram também disponibilizados por outras pessoas. Foi criado também um site para divulgar o Record Keeper com legendas em português que aparentemente podem ser baixadas. Eu não tentei portanto não sei se funciona. Clip do primeiro episódio:

 Assistam tudo se puderem (vale muito à pena!!) e depois nos falem o que acharam!

Se fosse hoje...

"Jesus foi por todo o nordeste, ensinando nas escolas, anunciando as boas notícias relacionadas com o Governo divino, e curando todas as enfermidades e doenças entre o povo. Notícias sobre Ele se espalharam por todos os países vizinhos, e o povo lhe trouxe todos que estavam padecendo vários males: pessoas com câncer, mal de parkinson, alzheimers, aids, esquizofrenia, paralisia, derrame, e doenças do coração; e ele os curou a todos.  Grandes multidões o seguiam vindas do Norte, Nordeste, Sul e Sudeste."

Mateus

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Os Adventistas são estranhos

Esse post é longo, desculpem-me pela prolixidade! É isso que dá quando se fica anos sem escrever neste blog!

Alguns anos atrás eu de repente “me toquei” que nós adventistas somos muito estranhos como uma denominação cristã e que nem percebemos isso. Aliás, em países muçulmanos, como o Egito, onde meu cunhado Kleyton agora trabalha como missionário, a igreja adventista passou por apuros no ano passado quando os outros cristãos quase conseguiram passar uma lei que excluía os adventistas do grupo de igrejas cristãs. Felizmente a lei não foi aprovada (ainda) e a igreja está lutando para continuar sendo reconhecida pelo governo. Depois eu volto a falar da questão dos países muçulmanos, mas ela está relacionada com o que eu vou explicar abaixo.

Quero abordar este assunto porque ele está me incomodando há anos e também porque  eu não tenho como discutir isso com muitas pessoas, só com uma amiga nossa, a Jenny, que é a nossa única amiga verdadeiramente “GEAna” aqui onde moramos. E vai ser ótimo ter a opinião (super informada!) de vocês. Além de uma perspectiva diferente de quem está no Brasil.

Na minha opinião, uma das razões pelas quais nós acabamos não reconhecendo/descobrindo que somos estranhos é que interagimos muito pouco com pessoas de outras denominaçõea cristãs (especialmente outras igrejas protestantes) e vivemos numa “bolha” isolada. Além disso, aí no Brasil há certas campanhas evangelísticas que exploram facetas de um país católico e que acabam mascarando um pouco a nossa “estranheza”, mas já volto a falar mais sobre isso.

O dia em que fiz esta descoberta de maneira mais intensa foi uma sexta-feira à noite em que estávamos ensaiando o nosso pequeno coral na igreja de Fairview Village na região da Filadélfia (Pensilvânia). Depois de 4 tumultuados anos frequentando uma pequena igreja brasileira, nós finalmente tínhamos decidido mudar para a igreja americana que ficava há 10 minutos de casa.

A igreja também era pequena (em número de membros), mas havia algumas novas famílias vindo, incluindo uma senhora boliviana que tinha recentemente se casado com um senhor americano que tinha sido pastor luterano, nosso amigo Bob. O Bob tinha muitos talentos musicais (tinha sido inclusive organista além de pastor) e então o chamamos para juntar-se ao nosso pequeno coral. Planejamos com o pastor um programa de páscoa para o sábado à tarde que antecedia o domingo de páscoa e nosso coralzinho ia cantar duas músicas, então, obviamente, marcamos um ensaio pra sexta à noite.

(Vou abrir um parênteses aqui pra contar que por muitos anos eu li o blog e me tornei muito amiga de uma [agora ex] blogueira que fez um PhD em teologia e que é episcopal/anglicana. Minha amiga Annie sempre escrevia muito sobre a sua igreja e sobre as diferentes celebrações que eles tinham, especialmente como os filhos pequenos dela se envolviam na celebração da páscoa: lava-pés na igreja na quinta à noite, como na sexta eles removiam os enfeites da igreja e a cruz (eu acho) e sábado à noite ficavam todos de vigília, tristes na igreja e a tinham uma vibrante celebração da ressurreição de Cristo ao nascer do sol de domingo, tudo muito interessante. Ela também sempre falava da quaresma e de vários outros eventos no calendário eclesiástico cristão – que no Brasil achamos que é apenas católico, mas que na verdade também é usado e respeitado por muitos protestantes. Fim do parênteses.)

Naquela sexta à noite, quando acabou o ensaio do coral, eu olhei pro meu amigo Bob e de repente tive um “estalo.” Eu falei que devia ser muito estranho pra ele estar ali naquela noite, Sexta-feira da Paixão, na qual ele provavelmente estaria na igreja, num culto, pois é uma data tão importante para as outras denominações cristãs mas que nós adventistas não “celebramos.” Depois disso tive algumas conversas com ele e, no mesmo ano, tivemos um judeu messiânico que veio à nossa igreja para celebrarmos um Seder (Páscoa Judaica) com simbolismo cristão que foi fascinante!

Eu entendo que o calendário cristão/católico tem muitas celebrações (senão quase todas) baseadas em festivais pagãos e esta é uma forte razão para nossa igreja não segui-lo, mas não é estranho que não vemos mal nenhum em celebrar o natal, mas não se celebra a páscoa? (Só porque é num domingo? só porque a data é relacionada com o paganistmo? O natal também é!) No Brasil às vezes se esquece que a igreja adventista oficialmente não celebra a páscoa porque a igreja adventista, super oportunista em termos de evangelismo (o que não é uma coisa ruim, só estou sendo chata), estabeleceu os “Calvários” – reuniões durante a Semana Santa que aproveitam a “onda” da semana mais celebrada da religião cristã e católica.

Aqui nos Estados Unidos obviamente não há isso, mesmo porque as igrejas protestantes principais (batista, metodista, etc), celebram mesmo só o domingo de páscoa, não tem nada na quinta-feira, sexta e sábado (são só católicos, episcopais e os luteranos que tem cultos/cerimônias nestes dias, pra celebrar a última ceia, a morte de cristo e a ressurreição ao nascer do sol de domingo). Vocês sabiam que existe lava-pés nestas denominações, mas só uma vez por ano na quinta feira que antecede a Sexta-feira Santa? (Nós, por outro lado, temos lava-pés nas "Santas-Ceias" que ocorrem em épocas aleatórias durante o ano, sendo que muitas outras denominações cristãs e os católicos, fazem a "comunhão" com o pão e vinho/suco em TODOS os cultos, qual é a razão das datas aleatórias da Santa Ceia?). 

À partir desta experiência com meu amigo Bob, eu comecei prestar mais atenção e a perceber a “estranheza” do adventismo em outros aspectos também. Guardamos o sábado, que foi estabelecido na criação, mas todas as outras festas judaicas foram “abolidas” porque já tiveram seu cumprimento em Jesus, é isso? Eu imagino que a posição oficial da igreja é que se alguém quiser celebrar as festas judaicas (páscoa judaica, dia da expiação, tabernáculos – esqueci os nomes judaicos) não há problema, mas que esta prática não tem nada a ver com a salvação. (como? Se as festas apontavam para Cristo sim, mas em vários lugares da Bíblia fala-se que deveriam ser celebradas em perpetuidade-- OK, pelo povo de Israel).

Tem uma outra coisa que me irrita ainda mais profundamente (e que é um ponto de contenção importante nos países muçulmanos). Como é que dizemos seguir os conselhos alimentares de Levíticos 11, mas não advogamos seguir uma dieta Kosher ou não comemos somente carne abatida da maneira própria (Kosher ou Hallal – deixando o sangue escorrer como as escrituras falam para fazer)? Aqui nos Estados Unidos a maioria dos Adventistas são ovo-lacto vegetarianos, mas ao redor do mundo não, e se come qualquer carne "limpa" de qualquer proveniência (exceto porco e frutos do mar). E tem outro problema! Os judeus que seguem a dieta Kosher, NUNCA misturam queijo com carne, já que a Bíblia fala para não comer o filhote da vaca com o leite da mãe. Inclusive eu conheci alguns judeus israelenses-americanos (não praticantes da religião, mas sim dos costumes) que eram ovo-lacto vegetarianos porque é muito mais fácil seguir a dieta Kosher sem comer carne. Eu não estou querendo ser uma chata legalista, só estou querendo questionar as nossas práticas que parecem ser bem "seletivas" -- seguimos a Bíblia literalmente em alguns lugares, e em outros não. (e eu NÃO SEI qual seria a solução para estes problemas, obviamente).

Não estou querendo argumentar que a alimentação "estilo Kosher" seria um ponto super-sério “de salvação,” mas  como explicar não comer carne de porco e frutos do mar e não seguir outras partes do capítulo 11 de Levíticus (comer carne abatida de qualquer jeito, com o sangue, e carne de vaca com queijo?).

Claro que mesmo o cumprimento parcial das leis alimentares é BOM, e é precisamente o que causa problemas nos países islâmicos. Uma das razões para os adventistas serem SUPER estranhos em países muçulmanos e às vezes NÃO considerados cristãos é que adventistas não comem porco e carnes imundas! Para os muçulmanos num país como o Egito, todos os cristãos adoram os santos e imagens (algo que é contrário aos princípios dos muçulmanos -- e que a igreja protestante na verdade procurou restaurar, retirando o culto às imagens) e são "sujos" -- isto é, comem carnes imundas. Então eles ficam super confusos com os adventistas, obviamente. Além de que nós também guardamos os sábado, então somos meio judeus (os "inimigos" do Islam), o que complica ainda mais as coisas.

Bom, onde é que eu estou querendo chegar com tudo isso? Estou apenas querendo saber a sincera opinião de vocês sobre estes assuntos, pode ser?

Um último comentário é que uma das coisas que me incomoda no fato de nós termos deixado de lado todos estes "rituais" do cristianismo/catolicismo é que rituais são coisas naturais ao ser humano e fazem com que crenças abstratas tornem-se mais significativas, especialmente para crianças -- daí a beleza da Santa Ceia como simbolismo, por exemplo. Acho que pode haver muita beleza simbólica e profunda nos rituais tradicionais do cristianismo e talvez isso seja algo que nos falta.



OK, terminei. Será que alguém conseguiu chegar até o fim? :-)

Lei e disciplina I

Quando formulamos os princípios do GEA USP segunda geração, ficou decidido entre outras coisas que nunca iríamos colocar na agenda tópicos para discussão tais quais: qual é o correto comprimento da saia da irmã, ou é certo ou errado ir ao cinema, ou qual é o tipo de música apropriada para cristãos ouvirem, ou jovens adventistas podem ou não usar jóias, jogar baralho, ler romances, comer carne, etc, ... enfim, todos estes assuntos que envolvem formas, geram debates infindáveis e dificilmente levam a algum lugar.

A igreja todavia não é o GEA, e a tendência é promover tais discussões, afinal jovens precisam de direção e não se pode esquecer o que é distintamente ser um adventista. É possível também que estejamos entrando numa fase na qual qualquer discussão dessa natureza é taxada como "salvação pelas obras", e é consequentemente um tabu.

A pergunta é como devemos lidar com esse assunto das formas na experiência religiosa? Se o assunto nunca for abordado será que alguém vai jamais saber o que é certo ou errado? Por outro lado, como evitar a guerra de facções e "achismos"?

Em futuras postagens gostaria de falar um pouco desse assunto em um contexto que raramente é usado dentro da igreja.


Tentando "ressucitar" o blog & Links

Eu (Lilian) e o Klebert tínhamos perdido o acesso às contas de email que criamos para postar neste blog, então estou mexendo um pouco no blog e testando deletar e acrescentar autores para podemos escrever novamente, OK?

O único "link" que tínhamos no blog é para um site que não existe mais (Progressive Adventist), então eu acrescentei um link pra um website HILÁRIO que foi criado no ano passado, Barely Adventist, que contém sátiras hilárias (todas fictícias, obviamente) a variados assuntos relacionados à vida adventista (aqui nos EUA).

Também acrescentei dois sites bem "opostos", o super-tradicional, baseando o neurótico às vezes, Advindicate e a instituição antiga e progressiva, a revista Spectrum.

Por favor, enviem mais sugestões de links! Eu gosto muito do site do Joêzer, mas, desculpem, não sou muito fã dos outros jornalistas adventistas que tem blogs. Na verdade só os li algumas vezes, mas não achei as discussões muito balanceadas.

Bom, vou parando por aqui, mas estou escrevendo um ou mais posts hoje. Está nevando forte aqui em New Market, VA, portanto não podemos ir à igreja e estamos tentando reativar o blog! Obrigada ao Gabriel e o Marco que nunca desistiram dele e continuaram postando esporádicamente.

(abraço, Lilian)