sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Contextos sócio-culturais

(nossa, que título chato, mas não consigo pensar em nada mais original...)

Bom, isto que vou escrever aqui em resposta ao meu amigo Gabriel e seu post anterior é apenas a minha opinião e também fruto de algumas conversas com o Klebert não fruto de leituras extensas ou profundas análises, viu? Então, lá vai o post que começou comentário e virou post.

Este lance da "salvação pessoal" reflete a influência do contexto sócio-cultural e da "visão de mundo" na qual os teólogos e as pessoas que organizam igrejas estão/estavam inseridos. No caso da nossa denominação e do protestantismo moderno, é o contexto sócio cultural protestante norte-americano, que sempre valorizou a individualidade e o esforço pessoal de cada pessoa.

É natural então que conforme a visão de mundo mude na era "pós moderna" (a passada seria chamada "moderna" e a os métodos de proselitismo do protestantismo moderno, até os anos 90 ainda, são calcados num raciocínio lógico "moderno" e na ênfase na salvação pessoal) comecemos a questionar o que veio antes, não somente baseado num desejo sincero de ir mais fundo, de questionar as normas pré-estabelecidas, mas também, buscando conciliar nossa nova visão de mundo (adquirida praticamente por osmose, por apenas existirmos e vivermos nesta época da história) à nossa crença religiosa. Hoje a ênfase é na comunidade, no grupo, preocupamo-nos mais com a igualdade social, com a autenticidade do que fazemos. E eu não quero questionar os autores que você está lendo, estou apenas tentando olhar o contexto histórico, “the big picture.”

Com sinceridade, eu acho impossível conseguir realmente voltar às origens, recapturar exatamente aquilo que seria o “puro evangelho,” a essência da jornada cristã. Mesmo naquela época, as pessoas, os escritos, estavam calcados numa realidade, num contexto sócio cultural que aparece claramente nas escrituras. Não temos problemas em analisar certos textos bíblicos como pertinentes apenas para a sociedade judaica da época, mas às vezes não conseguimos olhar para as nossas próprias doutrinas e práticas como fruto de um condicionamento (inconsciente) cultural e ideológico apenas (OK, agora parece que estou falando a mesma coisa que você, mas o ponto em que quero chegar é outro). O que e u quero dizer é que mesmo estes questionamentos (válidos, eu creio) com o qual você está envolvido, são parte do contexto sócio-cultural pós moderno.

Na opinião do Klebert, o Jim Hornberger (escritor de Fuga para Deus dentre outros), com a sua ênfase em ouvirmos a voz de Deus, é a pessoa que chega mais perto (na sua experiência e seus escritos) de uma resposta a esta pergunta do Gabriel: “Quais motivações seriam legítimas para conduzir nossa busca por respostas que tornem nossa vida cristã mais real e autêntica?” Eu ainda não tenho uma opinião formada. Eu me preocupo um pouco com o isolamento da experiência do Jim, mas talvez fosse isto que ele e sua família precisassem e cada um de nós deve buscar o seu próprio caminho. Mas nesse ponto eu concordo com o Gabriel – porque é que este caminho tenha sempre que ser “individual?” Ou, no máximo, uma família, casal e filhos, isolada, buscando a Deus? Como seres gregários que somos, uns mais do que outros (e nós amigos creio que fazemos parte da categoria de “muito gregários”), sempre acho desencorajador ter que enfrentar esta “jornada cristã” isoladamente.

E daí vem outros questionamentos bem pós modernos dos quais o “grande” Brian McLaren (cuja leitura eu iria sugerir para o Gabriel, pois acho que o ajudaria) tem sido porta voz (e em menor escala, ainda que com mais popularidade, o famoso mega-pastor Rick Warren também tem entrado nesta linha também). Resumindo bem: como podemos nos dizer cristãos e esquecermo-nos dos milhões de pessoas ao redor do mundo que sofrem em pobreza extrema, falta de água, falta de comida, etc. (notem que este é um “chamado” que faz mais sentido aqui nos EUA). A motivação neste caso não é “levar a salvação” para estas pessoas, é procurar resolver os problemas delas e também do planeta terra (preocupação ecológica, algo com o qual o cristianismo “mainstream” em geral, particularlmente aqui nos States não tem demonstrado a mínima preocupação – um assunto que me preocupa há anos e que eu levei à discussão no GEA-USP nos idos de 1992). Este e outros argumentos formam a base do livro mais recente do Brian Everything Must Change. Vou ser sincera com você, este é um tipo de “movimento” com o qual eu me sentiria confortável em estar envolvida em todos os níveis.

Agora, eu me preocupo, amigo (e esta é a parte do meu comentário perdido que é mais difícil recapturar, mas vou tentar) com as suas inquietações porque elas tem lhe levado a de certa forma a isolar-se, ou alienar-se, de pessoas que pensam diferente na sua ânsia de buscar profundas mudanças que eu concordo que são necessárias e importantes, mas não necessariamente possíveis (a curto prazo).

Você pode me achar acomodada, mas, depois de deixar sem olhar para traz o grupo brasileiro, agora estamos convivendo com um grupo de americanos mais do que “tradicionais.” E, por estranho que possa parecer, tem sido gostoso conhecer estar pessoas, conviver com elas, mesmo sabendo que temos pouquíssimas coisas em comum e que talvez discordemos radicalmente de suas visões teológicas (na época da eleição foi surreal, eu me sentia um E.T. no meu desejo fremente de que o Obama ganhasse, algo que eu nunca comentei com ninguém ali). E eu sinto-me em paz no momento. Não tenho ambições de mudar nada e ninguém. Claro... o vazio está lá às vezes, mas pelo menos estou tentando buscar a coerência primeiramente na minha vida pessoal e estou totalmente desencanada quanto à instituição. Não tenho a mínima esperança que a mesma mude e que venha a tornar-se significativa na minha vida. As lutas internas (vejam que intessante este grupo no facebook que esta buscando fazer um movimento visando a desegregação da igreja adventista – a única instituição segregada racialmente nos EUA) as politicagens, etc, vão sempre ofuscar o que um dia foi uma mensagem fremente, um movimento entusiasmado.

Então, eu não sei direito o que dizer sobre sua ânsia de voltar às origens. As várias origens (da igreja cristã, do protestantismo, do movimento ADV, etc.) foram influenciadas por vários aspectos complexos, é difícil isolar certos elementos e dizer que neles está “a pureza” do movimento. Desculpe-me se estou ficando um tanto “cínica,” acho que é o peso da idade :-D. De qualquer forma, eu acho que concordo com você que o “sonho original” de Deus é bem diferente do que as várias teologias cristãs tem pregado. E também creio que Deus seja flexível, no sentido que ele trabalha conosco do jeito que somos, por isso ele nos deu liberdade de escolha pra começar. Mas este já é um outro assunto...

Bom, então é isso aí, como dizem em inglês, eu partilhei a minha opinião, meus “two cents.” Ajudou alguma coisa? Espero que não tenha atrapalhado! ;-)

6 comentários:

Gabriel Henríquez disse...

Querida Lily,
Já li seu post umas tantas vezes, e estou com dificuldades para entender o que você quer dizer...
Pareceu-me que você quis dizer que os questinamentos que fiz são meramente fruto do "contexto sócio-cultural pós moderno" e, portanto, não são relevantes para a nossa experiência religiosa... me explica melhor, please...
Outro ponto que você citou 2 vezes foi que hoje são impossíveis as mudanças. A que mudanças você se referiu exatamente? E por que elas são impossíveis?
Um último ponto. Você quis dizer cínica mesmo, ou cética?
Me perdoa por insistir, mas quer sinceramente compreender a tua visão a respeito do post.
Beijos!
Gabriel.

Klebert disse...

Meus "two cents" agora.

Eu acho que a Lilian quis dizer sim que seus questionamentos, Gabi, são fruto do nosso "contexto sócio-cultural pós moderno", mas justamente por isso extremamente relevantes. Não fosse esse contexto não teríamos nem esse blog, que dirá a discussão. Não somente isso, mas as próprias respostas que acharemos devem automaticamente se encaixar no contexto. É meio como resolver um problema de matemática sabendo a resposta, entende?

Vou além especulando que no desejo de mudar o presente, buscamos no passado, com 'os óculos do presente', as respostas do futuro. Por exemplo, no Pagan Christianity o Viola reconhece que a igreja que está ai não mais serve o seu fim pois não é mais lagarta e sim uma irreconhecível borboleta. Ele propõe que a solução é voltar as orígens de lagarta. Será que sua defesa do retorno à orígem não se dá simplesmente porque a leitura que ele faz da prática religiosa nas orígens se adapta bem ao nosso contexto sócio-cultural pós moderno? Em outras palavras, será que se estivéssemos no limiar de uma era barbária (que as vezes achei estar entrando na em breve defunta presidência Bush, aleluia) o Viola não estaria resgatando as orígens da igeja da idade média? Ou fazendo uma leitura medieval da igreja primitiva?

Voltando à realidade depois do devaneio, estou começando a acreditar que uma estratégia melhor do que uma mudança radical é uma conspiração gradual no contexto do final do meu comentário ao seu post. Pelo menos não vamos correr o risco de ficarmos falando sozinhos...


PS. A propósito Gabi, por mais estranho quanto possa parecer, cinismo também faz parte da jornada em busca da fé autêntica e satisfatória!

Marco Aurelio Brasil disse...

Estou cos Feitosa nesse ponto. Estou lendo o Pagan Christianity right now (no trem agorinha, acabei o capítulo que fala sobre a roupa de igreja). Estou adorando a leitura, mas nem um tiquinho tentado a abraçar a visão do Viola sobre como a igreja é e como deve ser. Entendo bem o que a Lilian diz sobre temer ser chamada de conformista, eu temo o mesmo. Mas no fundo disso está uma certa confiança de que Deus permitiu que esse modelo de igreja aí se estabelecesse com algum propósito. Se esse propósito já está cumprido é muito difícil, para mim, vaticinar. Até aqui, minhas "conspiradas" têm sido exitosas, que Deus permita outras tantas. Quem quiser ver a última, está convidado à Classe do Coral no Unasp, a partir de 31/01. Amplexos!

Fred Torres disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fred Torres disse...

"por mais estranho quanto possa parecer, cinismo também faz parte da jornada em busca da fé autêntica e satisfatória"

Ahn? Como assim?

Osmar disse...

Oi Lilian,

Sabem, lendo seu post, me parece que você está com uma dor estranha, uma sensação que me parece que se apoiava sua vida religiosa em uma instituição, por mais que neguemos isso, e que você mesma diz que está agora totalmente desencanada. Me sinto assim também. Como falei no outro comentário que fiz há pouco, para quem não conhece nosso envolvimento, vai pensar que estamos nos transformando em inimigos da igreja, e eu não me sinto assim, apenas me sinto com uma necessidade de algo mais que a ela tem falhado em proporcionar, por culpa de quem quer que seja, pode ser minha também.
Há gente aqui dizendo que se Deus criou a igreja, deixa lá porque Ele sabe o propósito disso.
Se essa afirmação fosse uma verdade tão absoluta, como foi Deus quem criou o povo judeu, então não deveria haver cativeiro na Babilônia.
Será que Deus não chama pessoas com inquietudes diversas para fazer o que a maioria calma e serena, não está fazendo?
Sabem que a criatividade aumenta muito nas adversidades e nos conflitos. Será que isso não pode ser uma estratégia Diviina para que possamos chegar aos que a igreja comum não alcança?

Só prá pensar.

Abraços